terça-feira, 14 de junho de 2011

Ponto de ônibus.

Passos em direção ao nada. Pés que não são mais guiados: são levados. Duas almas andarilhas presas ao corpo. Já sabiam o caminho de casa. Cambaleavam preambulantes. Rumo ao lugar comum de sempre.

Vida escorrendo. Liquido impalpável sobre as mãos. Sangue deixando de correr nas veias. Um ato quase lisérgico, ponto de bala, de partida, piloto automático. Sinal vermelho, mesmo sem sinal vital.

Olhos ardendo pelo cansaço. O dia passava devagar sob o sol que queimava sua pele. Era mais um dia. Azul como sempre. Nem preto, nem branco.Cinza. Escaldante pelo asfalto, pele e suor. As nuvens pairavaram na imensidão azul e não havia um vento que as empurrassem  Teimavam em ficar onde estavam, cambaleantes assim como eu. Nem mesmo a força de algum pensamento as empurravam. Sufocadas. Sufocantes.

Rádio ligado. Telefones. Mãos. Muitas mãos. Calejadas, tímidas. Que seguravam a bolsa. Aparava o suor. Pulsos que giravam para conferir as horas. Braços cruzados como escudos. Balançantes ou sufocados dentro do bolso. Carregando sacolas, balançando ao vento, segurando a criança.

Era mais um dia.
Era mais um dia.
Era mais um dia.
Era mais um dia.

Eras e eras dentro das horas. Num ir e vir infinito. Vidas flutuantes. Horas latejavam. O abrir e fechar de olhos. O calor e frieza dos esbarrões continuos e contidos. Vergonha, leve constrangimento. Olhares cansados e preocupados, indiferentes, tão distantes. Ônibus lotados de almas tão vazias.
Mentes alheias e exorbitantes no ponto de ônibus. Apenas um ponto. Ponto de intersecção. Chegamos juntos aquele ponto. Sob o mesmo ponto do tempo e do espaço.
No pensamento fugaz e vulgar de cada um. Na cabine secreta, na prisão de você. O sucumbir. A implosão do eu em silêncio.

Todos os dias.
Todos os dias.

I still haven’t found what I’m looking for...



I still haven’t found what I’m looking for...

Esses versos contínuos, de uma das musicas mais conhecidas da banda irlandesa U2, ecoavam e me desconfortavam toda vez que os escutava. Apesar da musica indagar sobre a busca de Deus nas coisas matérias e físicas desse mundo, e evidentemente sem sucesso..o compositor fala que conhece a Cristo. E isso me atormentava. O que você ainda procura Bono? Você é cristão, você já achou. O que ainda há pra se procurar? O que eu ainda procuro?
Existe um mito, grandessíssimo e consolidado de uma alegria interrupta e imaculada que o cristão tem. Passamos de uma vida pra outra e nessa outra vida seremos felizes, sem duvidas, inquietações ou anseios. Apesar de crer que temos consciência e gravamos bem as palavras de que “no mundo teremos aflições” ainda nos culpamos quando a complexidade e as divagações da vida vêem nos visitar. Não nos damos o direito de nos sentirmos tristes, de ter duvidas ou sentirmos alguma ausência, algo que nos falta.
Uma viajante sente saudades da sua terra Natal. A cidade que ele está pode conter tudo que ele precise: um bom lugar pra passear, amigos, sua família poderá vir visitá-lo todos finais de semana, mas há algo em nosso lar que o torna especial. Nós cristãos, como viajantes por entre esse mundo, temos o direito a essa tristeza, a essa saudade do nosso lar. Apesar de Cristo compartilhar sua glória conosco ainda na Terra, esperamos ansiosos pelo dia que teremos a plenitude da sua glória, quando o veremos face a face.

You broke the bonds and you loosed the chains(Você quebrou os laços, soltou as correntes)
You carried the cross (Você carregou a cruz)
And my shame (E a minha vergonha)
You know I believe it (Você sabe que eu acredito nisso)

But I still haven't found (Mas eu ainda não encontrei)
What I'm looking for (O que estou procurando)

Buscamos em tantas coisas pra suprir essa ausência e quando a achamos e percebemos que não há encontramos nesse mundo e a suprimos no conforto de Cristo e no seu amor, ainda sim temos essa linha de saudade e esperança que nos traz a uma inevitável e saudável melancolia. I still haven’t found what I’m looking for, é um grito, uma súplica. Que em algum momento já tivemos na nossa vida e que ainda temos. Procuramos tanto, buscamos e nos empenhamos. E essa efemeridade da vida, essa incessante busca por coisas fúteis, mas necessárias pra nossa sobrevivência na Terra..nos alcançam e nos deprimem.
Os versículos ilustram bem o que eu queria falar, e talvez não consegui dizer:

"Por isso não desanimamos. Embora exteriormente estejamos a desgastar-nos, interiormente estamos sendo renovados dia após dia, pois os nossos sofrimentos leves e momentâneos estão produzindo para nós uma glória eterna que pesa mais que todos eles. Assim, fixamos os olhos, não naquilo que se vê, mas no que não se vê, pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno."
2Co.
"Porque agora vemos por espelho embaçado, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido." I Coríntios 13:12

Mais do que conhece-lo, vamos nos conhecer. Por enquanto, continuamos com essa busca, pelo sentido do nosso sentir, do que somos. Busca pela vida e tudo que ela carrega.